O sono dos justos e dos apertados
A noite estava quente, nem mesmo a fina e insistente chuva que trazia uma fresca brisa era suficiente para gerar conforto.
Não queria ler mais. Naquele momento tinha apanhado informações demais e comecei a refletir sobre aquilo que chamamos de oportunidade.
A questão ficava entre aquelas que nos são apresentadas e as que criamos. Peguei no sono.
Não dormi muito, mas o suficiente para sonhar e voltar à época de garoto, que, como minha mãe costumava dizer, “vivia fazendo estripulia!”
Um dos aspectos gostosos da infância é relembrar palavras que hoje pouco são usadas. Parece que dão um tom mais colorido às inocentes peraltices.
Nasci em uma cidade de muita água. Rios, córregos e minas, fartos. Um dos divertimentos era pescar.
Isso, eu fazia todos os dias, depois da aula. A vara, a garrafa de champagne, a lata de minhoca, a caixa com grilos, gafanhotos e iças, o saco de estopa, a peneira para mariscar, estavam sempre no jeito.
No rio, apanhávamos acarás, tilápias, pirambóias, cágados, às vezes. Nos córregos, uma quantidade enorme de lambaris, não com varas, mas mariscando.
Os inseparáveis, meu irmão Ivo, nosso grande amigo Fran, um japonesinho topa-tudo, e eu, nos arrastávamos de córrego a córrego, rio a rio, como nativos em busca de alimento. Conhecíamos cada ponto bom de pesca.
Quando resolvíamos pescar com as varas, lançávamos nossa garrafa de champagne, com o fundo cuidadosamente retirado, perfeito covo, cheia de água e farinha de milho, para capturar lambaris que seriam usados em armadilhas noturnas para fisgar traíras, que seriam recolhidas no dia seguinte.
A garrafa lançada em pontos estratégicos capturava peixes e liberava farinha que transformava os locais em cevas.
Dessa forma não só aproveitávamos as oportunidades como as criávamos.
A diversão se transformou em enorme compromisso, pois minha mãe, dona Alcida, já saturada de limpar lambaris, não era pouco o que trazíamos, resolveu declarar guerra e disse: – Eu frito, mas não limpo mais esses peixes!
Cá entre nós: – Já comeu lambari frito? Uma delícia não?
-Já limpou? Não?
-Não se meta! Dá um trabalhão!
Para isso tínhamos nosso macete. Uma tesourinha facilitava a tarefa, mas ainda assim era dureza.
A outra bronca era que chegávamos cheirando peixe e ninguém sabia porquê. Simples, desaparecíamos no meio do taboal para ver se encontrávamos preás, com isso as roupas ficavam encardidas. Essa é outra palavra bem própria da infância.
Nem o banho de rio, com roupa e tudo, antes de voltar, resolvia a questão. Na verdade piorava!
Ora, mas o que isso tudo tem a ver com oportunidade? Tudo!
Se você quer pegar o peixe tem que descobrir onde está ou atraí-lo. Assim é a vida, transforme seus objetivos em peixes e saia para capturá-los. Antes, aprenda tudo sobre os recursos que o ajudarão a ter sucesso.
Ah, mesmo depois de capturado saiba que para desfrutá-lo, terá que limpar, temperar e fritar.
Exausto com a empreitada poderá à noite dormir o sono dos justos?
Nem sempre quando se pesca, pois não há garantia permanente de sucesso, apenas a certeza de muito trabalho.
Para o pescador, que tem que lutar pelo sucesso diário, não importa quão justo ele é, mas quão apertado está!
Seu poder de superação está na sua origem: Assim como Pedro, nasceu pescador!
Ivan Postigo
Diretor de Gestão Empresarial
www.postigoconsultoria.com.br